sábado, 15 de maio de 2010

O 6º turno - "Uma viragem"

Foi o meu sexto turno no serviço, uma noite e como todas elas, foi muito longa, deu para muita coisa e apesar do cansaço, fico feliz que tenha dado para tanta coisa. Aprendi muito nesta noite, desde muitas coisas que fiquei de estudar para o turno de hoje, que junto da enfermeira assimilei e acrescentei mais algumas coisas que faltaram, a outros conhecimentos que fui adquirindo ao longo do turno.
Saí realmente esgotado do turno, feliz mas esgotado, foram dois dias intensos de estudo e depois culminar com o turno longo trouxe muitos beneficios para mim, já que aprendi bastante mas a verdade é que cansou bastante. A nível de contacto com as crianças/adolescentes e familias, como foi um turno da noite, não aconteceu muito, nem aconteceram situações que me levem a reflectir muito, embora haja sempre algo que me deixe mais pensativo. Foi o caso de uma menina nova, que regressou ao serviço à dois dias. Eu não a conhecia, ouvira falar dela mas ainda não a conhecia. Foi hoje que isso aconteceu, conheci-a e pareceu-me uma miúda muito corajosa (como não poderia deixar de ser, após tanto tempo de tratamentos) e consciente do que se passa com ela. Fico muito feliz que, mais uma vez tenha tido oportunidade de conhecer mais uma criança com esta coragem, que tanto tem passado mas mantem uma força imensa e determinação com vista a lutar contra algo que não se pode fugir para já.
O menino com que fiquei, o herói de quem falei no ultimo turno, ali estava, como o tenho visto, calmo e a descansar. Só acordou no final do turno e estava assustado por era por uma razão menos boa, uma colheita de sangue. Embora não lhe doesse ele não sabia ao certo para que era que ali estávamos e eramos os "de branco", logo ainda significa para ele sofrimento. Ainda não cortou o cabelo, algo que a mãe tinha pensado em fazer hoje. Estava já à espera de o ver com o cabelo um pouco cortado mas a verdade é que ainda não foi hoje que esse passo aconteceu. Deve ser realmente um ponto de viragem dificil de dar e de viver, porque inicia psicológicamente uma fase dificil da vida, marca visivelmente o que vai acontecer, tratamentos duros e prolongados.
A verdade é que hoje reparei e dei valor a uma coisa, que já vira, já tinha pensado mas hoje foquei com alguma maior atenção. As familias, os acompanhantes, que durante todo este processo doloroso para os filhos/netos/sobrinhos, mas não menos para eles, os acompanham diáriamente, que no caso do acompanhante oficial fica junto deles 24 horas do dia, a dormir, comer, tomar banho num sitio completamente estranho (que com o tempo, infelizmente, deixa de o ser), a conviver com pessoas que não conhecem, a dormir (quando dormem) em sofás que por muito confortáveis que possam ser, não têm o conforto da sua cama, do seu lar. Claro que se evita ao máximo que a mudança da criança/adolescente e familia, se dê de forma brusca, tentando manter o conforto de um lar, com espaço próprio para cadaum com tudo a que têm direito, mas a verdade é que isso não é possível na totalidade. Depois de ter pensado nisso, pude ver que uma doença oncológica numa criança, é uma doença que fisicamente está presente na criança, mas muitas das vezes as familias, os seus apoios, não sofrem menos que elas, acredito que sofrem com praticamente a mesma intensidade, tratamentos e internamentos prolongados, com as suas vidas em stand-by esperando poder ver bem quem mais gostam. É isto, situações destas, ligações assim que nos distinguem de muitos dos restantes animais, a sensibilidade, a dedicação ao outro que nos é tanto...a humanização.
Resumindo, foi um turno cansativo, muito cansativo, mas muito positivo, permitiu-me aprofundar conhecimentos, reflectir acerca de muitas coisas e dar valor a muitas delas.

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